Neurodiversidade nas escolas: o papel do professor na educação de crianças neurodivergentes

Postado em 18 de dez de 2023
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Antes mesmo de ter um nome e constituir um movimento, a neurodiversidade já fazia parte do dia a dia de escolas de todo o Brasil. Descubra o que todo educador deve saber sobre o assunto 

Não existe um número oficial de crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) no Brasil. Mas levantamentos feitos dentro e fora do país ajudam a entender a amplitude da neurodiversidade da população. 

O Centro de Controle de Doenças e Prevenção dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês), divulgou em dezembro de 2021 um estudo sobre a prevalência de TEA em meninos e meninas norte-americanos.

Uma a cada 44 crianças é diagnosticada com TEA aos 8 anos de idade nos EUA, um aumento de 22% em relação a 2020 – a proporção na pesquisa do ano anterior foi de 1 para 54. Ainda, o número de meninos com o transtorno é quatro vezes maior do que o de meninas. 

Sobre o TDAH, a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) estima que 2 milhões de brasileiros adultos lidem com os sintomas do transtorno. A quantidade não é exata pois o transtorno ainda é subdiagnosticado no país.

Mesmo sem levantamentos oficiais, é fato que crianças e adolescentes neurodivergentes fazem parte dos quadros de estudantes de escolas de todo o país. E provavelmente você já deu aulas para elas. 

Todo professor precisa conhecer as principais características da neurodiversidade se quiser promover uma educação verdadeiramente inclusiva. Aqui você vai conhecer as origens do movimento, os principais transtornos de neurodesenvolvimento e o que fazer para ajudar estudantes neurodivergentes.

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O que é neurodiversidade

Neurodiversidade é um conceito que defende que uma conexão neurológica atípica ou neurodivergente é uma manifestação da diferença humana e não uma doença que precisa ser curada.

O conceito foi usado pela primeira vez pela socióloga australiana e portadora da Síndrome de Asperger Judy Singer em 1998, em uma tese defendida na Universidade de Tecnologia de Sidney. 

Um ano depois, a pesquisadora escreveu o capítulo “Why can't you be normal for once in your life? From a 'Problem with No Name' to a new category of disability” para o livro “Disability Discourse”, popularizando assim a expressão fora do meio acadêmico.

O termo também é usado para designar um movimento liderado por pessoas diagnosticadas com TEA que veem o autismo como uma parte constitutiva do que elas são. Elas têm o objetivo de conscientizar a sociedade sobre a neurodiversidade, por isso, desde 18 de junho de 2005, é celebrado o “Dia do Orgulho Autista” em todo o mundo, inclusive no Brasil. 

A diferença entre neurodivergente e neurotípico

A expressão “neurodivergente” se refere a pessoas que têm um desenvolvimento ou funcionamento neurológico diferente do padrão esperado pela sociedade em geral. Já “neurotípico” trata de um indivíduo que tem um neurodesenvolvimento considerado regular. 

As duas palavras são muito usadas pela comunidade autista, mas não são categorias médicas formais. 

As principais manifestações de neurodiversidade

Na perspectiva da neurodiversidade, o TEA, o TDAH e demais condições não são consideradas transtornos. No entanto, os principais manuais médicos classificam essas manifestações de neurodiversidade como transtornos de neurodesenvolvimento. 

Os transtornos de neurodesenvolvimento são condições de déficit no desenvolvimento que trazem prejuízos no funcionamento pessoal, social, acadêmico ou profissional, segundo a 5ª edição do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), desenvolvido pela Associação Americana de Psiquiatria (APA).

Os principais transtornos de neurodesenvolvimento, segundo o DSM-5, são: 

  1. Transtornos de desenvolvimento intelectual
  2. Transtornos de comunicação 
  3. Transtorno do Espectro Autista (TEA)
  4. Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) 
  5. Transtornos específicos de aprendizagem
  6. Transtornos motores 

É preciso ressaltar que nem todos os representantes da comunidade autista acreditam que o TEA não seja um transtorno. 

Os graus de neurodiversidade no TEA

A neurodiversidade abrange várias diferenças neurológicas, como listamos acima. Aqui você vai ver a classificação da gradação do autismo, de acordo com o DSM-5 e o CID-11. 

O DSM-5 divide o TEA em três níveis de suporte: 

  1. Leve
  2. Moderado 
  3. Severo 

Na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID 11), o TEA é descrito como “um transtorno caracterizado por déficits persistentes na habilidade de iniciar e manter interações sociais recíprocas e por padrões de comportamento, interesses ou atividades que são atípicos para indivíduos de determinada idade ou contexto sociocultural”.

A descrição do TEA é dividida em 7 categorias:  

  1. 6A02.0 – Transtorno do Espectro do Autismo sem deficiência intelectual (DI) e com comprometimento leve ou ausente da linguagem funcional;
  2. 6A02.1 – Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com comprometimento leve ou ausente da linguagem funcional; 
  3. 6A02.2 – Transtorno do Espectro do Autismo sem deficiência intelectual (DI) e com linguagem funcional prejudicada;
  4. 6A02.3 – Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com linguagem funcional prejudicada; 
  5. 6A02.5 – Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com ausência de linguagem funcional;
  6. 6A02.Y – Outro Transtorno do Espectro do Autismo especificado; 
  7. 6A02.Z – Transtorno do Espectro do Autismo, não especificado. 

O CID-11 é elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e está em vigor desde 1º de janeiro de 2022.  

Essas classificações são ferramentas importantes para diagnóstico, mas é importante considerar que o TEA não pode ser lido de forma linear. Cada autista é único e demanda suportes específicos.

 

Como promover a inclusão de estudantes neurodivergentes

A neurodiversidade é uma realidade nas escolas. Mas qual o papel do professor na relação com os estudantes neurodivergentes? 

Ressaltamos que não é função do professor nem da escola fazer o diagnóstico de crianças e adolescentes.

Caso o docente observe em um estudante algum comprometimento na interação social ou interesses em atividades repetitivas, ele deve informar a coordenação pedagógica. Esta vai informar os pais e orientá-los sobre o encaminhamento da criança para avaliação profissional. 

O que é de responsabilidade de todo educador e instituição de ensino é a promoção da inclusão de crianças e adolescentes neurodiversos, de acordo com a Lei nº 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.

O texto assegura que todo indivíduo com TEA tem o direito à Educação em todos os níveis de ensino, o que está alinhado ao artigo 205 da Constituição Federal.

Sim, a inclusão é desafiadora. Nem todas as escolas contam com o apoio de profissionais do Atendimento Educacional Especializado (AEE) ou com salas que tenham um professor e um auxiliar. 

Tampouco existe uma receita, um passo a passo, para ensinar crianças e adolescentes neurodivergentes. 

Mas existem boas práticas que são um ótimo ponto de partida para construir uma escola inclusiva:

  • Conscientizar todos os professores e funcionários da escola sobre a neurodiversidade. Eles podem trocar experiências e pensar em soluções juntos; 
  • Acompanhar diariamente os estudantes neurodiversos para entender suas particularidades e adaptar estratégias. O indicado é fazer um Plano Educacional Individualizado (PEI) para cada um deles; 
  • Conversar com a turma sobre a neurodiversidade e explicar que os colegas podem precisar de ajuda para participar das aulas;
  • No caso de estudantes do espectro autista, deve-se evitar abraços e apertos de mão a não ser que a criança manifeste intimidade para isso;
  • Flexibilizar o currículo escolar quando necessário. 

Também é importante que o professor busque conhecimento sobre neurodiversidade, tanto com pesquisadores e especialistas sobre neurodesenvolvimento quanto com quem é neurodivergente. 

Uma ótima fonte de informação é o canal do YouTube “Mundo Autista”, das jornalistas e escritoras Selma Sueli Silva e Sophia Mendonça. Elas são mãe e filha e ambas estão dentro do espectro autista.

Confira abaixo um dos vários vídeos em que elas contam como é o dia a dia de pessoas neurodivergentes:

A ficção é outra forma de entender as especificidades dos seus estudantes. Séries de TV como “Atypical” (Netflix, 2016), “Speechless” (ABC, 2016) e “Special” (Netflix, 2019) abordam a neurodiversidade com leveza. Elas foram bastante elogiadas pela comunidade autista por representarem o cotidiano de pessoas neurodivergentes de forma respeitosa e verossímil.

Se você pensa em trabalhar exclusivamente com a inclusão, o ideal é buscar uma especialização em áreas como educação inclusiva, psicopedagogia e neuropedagogia.

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Olívia Baldissera

Por Olívia Baldissera

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Jornalista e historiadora. É analista de conteúdo do Blog do EAD.