O papel do professor em uma comunidade de aprendizagem

Postado em 15 de set de 2023
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Não é novidade que a nossa sociedade muda e se reinventa a todo momento. O mesmo acontece (e deve acontecer) com os processos de aprendizagem. 

Contudo, há escolas que não têm interesse em mudar as técnicas de educação ofertadas, tornando-as ultrapassadas e, muitas vezes, até mesmo inadequadas. 

Se uma sociedade muda, seus atores sociais também mudam, ou seja, os estudantes que queremos educar não seguem o mesmo comportamento das décadas passadas, assim como seu processo educativo também precisa ser diferente. 

Foi pensando nisso que surgiram as comunidades de aprendizagem, com o objetivo de inovar na educação e na forma de educar, convertendo a escola em um agente de transformação social, com conceitos e estruturas diferentes do método tradicional. 

O professor é também protagonista dessa história, junto com seus estudantes, e tem um papel essencial nesse processo. 

Entenda a seguir como funcionam as comunidades de aprendizagem e o papel do professor nessa estrutura: 

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O que são as comunidades de aprendizagem

Aprender em comunidade, junto de todas as pessoas que podem oferecer conhecimento. 

Fazer com que o ambiente escolar extrapole muros e construções prediais tradicionais. 

Esses são conceitos-chave para entender as comunidades de aprendizagem. Elas são projetos educativos que extrapolam os limites da escola, envolvendo toda a comunidade no processo de formação de seus indivíduos. 

Todo o ambiente se transforma num local de educação, que engloba todos os que vivem naquele local. As práticas desta metodologia são comprovadamente eficazes, mudando a visão de sala de aula e dando uma nova opção para a gestão escolar. 

As comunidades de aprendizagem também visam a aumentar a autoestima de estudantes e professores, possibilitar e democratizar o acesso a conhecimentos e habilidades que proporcionam a crianças e adolescentes uma maior igualdade de possibilidades e, por consequência, condições de vida mais favoráveis. 

Nessa perspectiva, a escola deve priorizar o diálogo, a participação, a cooperação e a solidariedade entre todos que são da comunidade educativa, tendo o objetivo de melhorar a educação das crianças. 

Em suma, as comunidades de aprendizagem querem desenvolver um ambiente que colabore para diminuir índices de desigualdade e exclusão social. 

Um dos projetos mais conhecidos dessa abordagem foi criado em meados dos anos 1990, em Barcelona, quando escolas espanholas quiseram reverter os índices baixos de aprendizagem no país e o chamado fracasso educacional. 

Foi com o objetivo de achar uma solução eficaz e diferente do modelo tradicional que surgiu a comunidade de aprendizagem, de acordo com o Centro Especial de Investigação em Teorias e Práticas Superadoras de Desigualdades (CREA) da Universidade de Barcelona. 

Esse  modelo educacional foca nas técnicas de aprendizagem e conteúdo, mas também nas interações e relações sociais de todos os indivíduos num círculo social. Hoje em dia, mais de 120 instituições de ensino aderiram a metodologia na Europa.

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As 7 atuações educativas de êxito da comunidade de aprendizagem

Um dos focos das comunidades de aprendizagem é envolver familiares, conhecidos e demais membros da comunidade num espaço de diálogo humanitário. 

Para isso, o projeto INCLUD-ED, desenvolvido pelo CREA da Universidade de Barcelona,  propõe 7 Atuações Educativas de Êxito para transformar o ambiente escolar em um lugar onde todos aprendem, todos ensinam e todos têm um papel socioeducativo importante. 

As 7 Atuações Educativas de Êxito que devem ser aplicadas nas comunidades de aprendizagem são: 

1. Grupos interativos

Separar os estudantes em grupos de 4 ou 5 pessoas, da forma mais diversa possível. O grupo deve contemplar gêneros, culturas e níveis de aprendizagem diferentes. 

O professor deve planejar atividades para passar para as equipes, que devem interagir entre si de forma igualitária para realizá-las. As atividades devem mudar a cada 15 ou 20 minutos. 

Cada grupo conta com um tutor da comunidade escolar que vai mediar a interação entre os integrantes. 

2. Tertúlias dialógicas

A partir de livros, músicas e demais obras de artes, crianças e adolescentes conversam entre si para construir coletivamente significados e conhecimentos. 

Nas tertúlias, o professor tem o papel de moderador, estimulando a participação igualitária de todos. 

3. Biblioteca tutorada 

Nas escolas que querem adotar a abordagem da comunidade de aprendizagem, a biblioteca deve ser aberta fora do horário letivo, em especial aos finais de semana, para que crianças, jovens e adultos tenham um espaço de aprendizagem de acesso livre e gratuito. 

O trabalho de tutoria é feito por voluntários, que organizam o espaço e as atividades de acordo com os objetivos dos usuários da biblioteca. Os estudantes podem fazer a lição de casa, leitura dialógica e pesquisa para trabalhos. 

4. Formação de familiares

A escola também deve trabalhar a formação dos familiares dos estudantes, estimulando-os a serem voluntários nas demais Atuações Educativas de Êxito da comunidade de aprendizagem. 

É importante conversar com pais, avós e responsáveis sobre o que eles querem aprender, como e quando. 

5. Participação educativa da comunidade

Gestores escolares, equipe pedagógica e professores devem promover o envolvimento direto das famílias e da comunidade em todos os espaços de aprendizagem da escola. 

A instituição de ensino pode criar uma comissão mista e convidar os pais para participar. Essa comissão seria responsável por organizar as Atuações Educativas de Êxito e encontrar voluntários para as atividades. 

6. Modelo dialógico de resolução de conflitos

Uma comunidade de aprendizagem deve envolver estudantes, familiares e professores no debate sobre as normas de convivência da escola. 

7. Formação pedagógica dialógica

A formação de professores, supervisores, pedagogos e gestores deve ter bases científicas e teóricas ancoradas em evidências respaldadas pela comunidade científica internacional. 

É preciso saber discernir o que é opinião do que é conhecimento científico consolidado. Para isso, os educadores devem aprender em conjunto, conversando entre si sobre as leituras que fizeram e suas experiências.

 

O papel do professor nas comunidades de aprendizagem

Um ponto importante que devemos mencionar sobre as comunidades de aprendizagem é que há uma reestruturação do ambiente escolar. 

A mudança na organização da escola também tem a ver com mudança nas relações de poder: antes, a escola está subordinada aos objetivos e às tarefas propostas por todos. Nas comunidades de aprendizagem, a organização está subordinada às prioridades definidas pela comunidade. 

A organização estrutural, arquitetonicamente falando, é antiga. O novo projeto propõe uma organização diferente, não estática e participativa que possibilite uma melhor aprendizagem. Isso consiste em romper com o isolamento dos professores e com salas de aulas fechadas, por exemplo. A liderança escolar dá lugar ao convívio igualitário.  

Isso mexe com toda uma mudança de pensamento dos envolvidos da equipe escolar, que terão funções diferentes e com outras execuções. Nesse modelo, existem comissões escolares mistas (comunidade-professores), com funções específicas, como uma comissão de novas tecnologias, de refeitório, de estratégias pedagógicas, etc. 

Há ainda a otimização de recursos, delegação de responsabilidades, organização de grupos diversos (como de voluntariado), organização de sala de aula e outros pontos. O espaço também será otimizado, assim como o tempo de atividades dos estudantes, com uma metodologia baseada nos agrupamentos flexíveis e a aprendizagem baseada na cooperação e no diálogo. 

Em sala de aula, mais pessoas entram e participam. A aprendizagem se torna recíproca e cooperativa, tornando os professores mestres de toda a comunidade.  

A partir da cooperação e do diálogo, amplia-se o grau de responsabilidade e autonomia de todos os participantes, além de destacar o papel ativo de crianças e adolescentes no seu aprendizado.

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4 educadores reconhecidos pelo trabalho em comunidades de aprendizagem no Brasil

O Brasil foi lar de alguns educadores que se destacaram por seus trabalhos em comunidades de aprendizagem. Suas iniciativas nessa área revolucionaram a educação e nos dão exemplo até hoje de como seguir alternativas saudáveis e eficazes para garantir um ensino igualitário e democrático. 

Vamos conhecer esses educadores? 

Alessandro Cerchiai (1877-1935), fundador da Escola Libertária Germinal, em São Paulo

Alessandro Cerchiai nasceu na Itália, em 1877. Emigrou para o Brasil por volta de 1890, onde se juntou aos imigrantes anarquistas dos bairros operários de São Paulo. Entre 1902 e 1904 se dedicou à Escola Libertária Germinal, que, aparentemente, encerrou as suas atividades por falta de recursos. 

Pela escassez de informação que há sobre esse educador, não há como ter uma certeza das datas, mas estima-se que entre 1914 e 1916 deixou a capital paulista e foi viver em Bauru, onde teria lecionado numa escola anarquista. 

Lá ele lecionava sobre a ideia de solidariedade anarquista e pretendia mostrar aos estudantes a relação entre liberdade e responsabilidade.

Eurípedes Barsanulfo (1880-1918), fundador do Liceu Sacramento e do Colégio Allan Kardec, em Minas Gerais

euripedes-barsanulfoCréditos: Reprodução/Centro de Estudos Filosóficos Espíritas

Nascido em maio de 1880 na pequena cidade mineira de Sacramento, Eurípedes Barsanulfo se destacava desde cedo na educação. Conta-se que na escola ajudava os professores e gostava de auxiliar os colegas no processo de aprendizagem. 

Mais tarde, manteve seu interesse pela educação e também aderiu à religião espírita, se destacando também nessa atuação, inclusive na mediunidade. Essa fé influenciou na sua atuação como professor, quando, em 1907, criou o Colégio Allan Kardec. Foi diretor do colégio, mas nunca deixou de lecionar. 

Nise da Silveira (1905-1999), fundadora da Casa das Palmeiras, no Rio de Janeiro

nise-da-silveiraCréditos: Arquivo Nacional/Wikimedia Commons

A médica Nise da Silveira prezava por uma abordagem humana no tratamento de pacientes psiquiátricos. Ela incentivada o contato físico entre médico e paciente e pela criação de ateliês de pintura, música, teatro, modelagem e encadernação. 

Ela desenvolveu no Centro Psiquiátrico Pedro II, localizado no Rio de Janeiro, um programa que, por meio da educação e do aprendizado, proporcionava uma melhor qualidade de vida para quem sofria com transtornos mentais. 

Era seguidora da psicologia baseada em Carl Gustav Jung no Brasil, fundando, em 1952, o Museu de Imagens do Inconsciente, um acervo completo de obras de arte produzidas por seus próprios pacientes. 

Em 1956, fundou a Casa das Palmeiras, com ajuda de colegas que tinham ideias semelhantes às dela. Era uma instituição independente, que visava à reabilitação de pacientes egressos de instituições psiquiátricas. Baseava-se em tratamento com o direito de ir e vir, sem grades nas janelas, com relação de igualdade entre médico e paciente e como regime de externato. A socialização também era incentivada. 

Em 2000, o Centro Psiquiátrico Pedro II começou a se chamar Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira, em sua homenagem. 

Agostinho da Silva (1906-1994), reconhecido pelo seu trabalho em comunidades de aprendizagem na serra do Itatiaia

agostinho-da-silvaCréditos: Reprodução Facebook Associação Agostinho da Silva

O português Agostinho da Silva estudou na Faculdade de Letras do Porto, onde iniciou estudos em Românicas, transferindo-se logo em seguida para o curso de Filologia Clássica. 

Lecionou em liceus públicos, mas foi demitido em 1935 por não aceitar assinar um documento afirmando não fazer parte de nenhuma organização secreta, medida essa que foi tomada no contexto da ditadura salazarista. 

Após tentar a vida na Espanha, retornou a Portugal, se inteirando em diversas iniciativas pedagógicas e culturais, até ser preso pelo regime ditatorial, em 1943.  

Após sair da prisão, morou no Uruguai, na Argentina e no Brasil, onde, no Rio de Janeiro, trabalhou no Instituto Oswaldo Cruz e ensinou na Faculdade Fluminense de Filosofia.  

A partir de 1952, foi professor na Universidade Federal da Paraíba (UFPA) e, em 1955, ajudou a fundar a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Foi ainda professor na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e também auxiliou na fundação da Universidade de Brasília (UnB), onde criou o Centro Brasileiro de Estudos Portugueses. 

Com o endurecimento da ditadura no Brasil, Agostinho retorna a Portugal, onde escreve diversas obras sobre filosofia, educação e cultura. Volta a lecionar em 1974, depois da Revolução dos Cravos, que trouxe de volta a democracia em Portugal. 

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Conclusão

A partir das ideias da comunidade de aprendizagem, notamos que apenas com uma mudança real é possível chegar num objetivo de melhorar a educação e deixá-la mais democrática. 

Com conceitos humanitários baseados no diálogo e na inclusão, as comunidades de aprendizagem se mostram uma opção eficaz no meio da educação.

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